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26 de maio de 2018

O autêntico tradicionalismo gaúcho tem potencial para atrair turistas?




Ao apagar da Chama Crioula, a cada 20 de setembro no Acampamento Farroupilha de Porto Alegre, o sentimento é um só entre os quatro mil “moradores” do evento: nostalgia. Foram pelo menos duas semanas intensas de trabalho, de vivência prática da cultura gaúcha, e o mais importante, momentos de amizade e hospitalidade. Algum desavisado poderia questionar: mas não é assim o ano inteiro, dentro dos galpões tradicionalistas? A resposta é: sim e não. Sim porque a autêntica prática tradicionalista faz parte do cotidiano de segunda a segunda, seja na lida campeira, seja no gosto artístico, seja pelo hábito do chimarrão e do churrasco. E não, por outro lado, porque receber o público de fora, explicar sobre os usos e costumes, conhecer sotaques de todos os cantos do Brasil e exterior não é todo dia que acontece. E então, inevitavelmente, surge outra pergunta: mas e se pudéssemos ter isso o ano todo?
Não é novidade o desejo de tradicionalistas de tornar permanente um evento como o Acampamento Farroupilha. Provavelmente menor do que o atual, que conta com 350 piquetes e recebe mais de um milhão de visitantes a cada edição. Quem sabe uma pequena mostra, para atender especialmente turistas? Os números sugerem que a iniciativa poderia ser sucesso. Nas últimas edições do evento, por exemplo, o projeto Turismo de Galpão, da Secretaria Municipal de Turismo e realizado como programação integrante do Acampamento com oficinas diversas, registrou a presença de visitantes de mais de 40 países. E todos se lembram do sucesso que foi o Acampamento da Copa.
Tradicionalismo o ano todo
Se o projeto do Acampamento Farroupilha permanente um dia sairá do papel, não se sabe. Por ora, o que se tem certo é que os tradicionalistas da 1ª Região Tradicionalistas estão dispostos a imediatamente abrir as portas dos galpões para receber turistas. Nos 11 municípios que compõem a RT (Alvorada, Barra do Ribeiro, Cachoeirinha, Eldorado do Sul, Glorinha, Gravataí, Guaíba, Mariana Pimentel, Porto Alegre, Sertão Santana e Viamão) são mais de 120 Centros de Tradições Gaúchas instalados e funcionando. Quantos destes adeririam ao projeto Turismo Criativo Tradicionalista? É o que a 1ª Região Tradicionalista quer descobrir.
O projeto desenvolvido por Paulo Roberto Guimarães e o coordenador Luís Lamaison prevê um primeiro contato com as entidades tradicionalistas, para depois ser iniciada a articulação com demais órgãos para uma PPP – Parceria Público Privada. O objetivo é criar nos CTGS um produto turístico, usando o verdadeiro tradicionalismo, que possa ser vendido para as agências que fazem receptivo, oportunizando assim que os turistas tenham a oportunidade de conhecer as reais tradições do nosso estado e não o arremedo de tradição que é oferecido nas churrascarias. O turismo cultural e criativo nos países desenvolvidos é um importante segmento econômico para gerar renda e desenvolvimento cultural, afirma Guimarães, que já imagina intensas atividades nos galpões tradicionalistas com apresentações artísticas (dança, declamação…), churrasco, música e oficinas diversas para receber o público.
A marca gaúcha é muito forte
O vice-presidente de Relações Externas da AbavRS – Associação Brasileira das Agências de Viagem do Rio Grande do Sul, Clóvis da Rosa, vê a iniciativa com entusiasmo. Segundo ele, realmente faz falta um projeto turístico que apresente a cultura gaúcha para os visitantes. Ele lembra que hoje, no Brasil, somente dois estados têm uma forte identidade regional. “Quando você vê uma mulher com um turbante e vestido largo, você sabe que está em contato com a cultura da Bahia. Quando você vê alguém tomando chimarrão, você sabe que está diante de um gaúcho”, afirma. O Rio Grande do Sul, na opinião de Clóvis, não sabe explorar essa marca, que é muito forte e consolidada. Na opinião dele, alguns destinos no Brasil são exitosos na exploração de sua identidade local na indústria do turismo. Ele cita o exemplo do Nordeste e também de Santa Catarina. Esses destinos, afirma Clóvis, investem forte na divulgação, especialmente em feiras turísticas. Porto Alegre, na sua opinião, precisa ainda fazer melhor seu tema de casa, como preparar pontos de informação turística. Uma de suas sugestões é criar um comitê para discutir e implementar melhorias na cidade.
A importância de uma agenda permanente
A rede hoteleira de Porto Alegre, segundo o presidente da Abih – Associação Brasileira da Indústria de Hotéis, José Reinaldo Ritter, está de portas abertas para o projeto de turismo tradicionalista. “Acho fantástico”, afirma Ritter. Segundo ele, a iniciativa pode se constituir num importante atrativo para reter em Porto Alegre o turista que desembarca no aeroporto Salgado Filho e ruma direto para a Região das Hortênsias, notadamente Gramado. Calcula-se que aproximadamente 90% dos turistas que chegam a Porto Alegre via aeroporto busquem Gramado como destino. “No passado já houve algumas tentativas nesse sentido, como cavalgadas da lua cheia, mas era em dias específicos. Se tivéssemos todo dia pelo menos um CTG aberto seria um ótimo atrativo”, afirma. “Ao meu ver, é uma questão de organizar e mobilizar os agentes”, diz Ritter.
Desenvolvimento de um Plano de Negócios
“Quem concebeu este projeto está de parabéns”, afirma Abdon Barreto Filho, diretor de turismo da Secretaria Estadual de Turismo e Cultura do Rio Grande do Sul. Segundo ele, é um projeto muito interessante. A ideia é muito boa, necessitando agora que se desenvolva o produto e seu lançamento. Suas sugestões são desenvolver o plano de negócios, articular com os agentes, definir bem os papeis e então proporcionar a experiência da cultura gaúcha aos visitantes.
Inspiração para todas RTs
Segundo o presidente do MTG, Nairo Callegaro, o desenvolvimento turístico das atividades tradicionalistas pode ser uma importante ferramenta para difusão da cultura gaúcha e também meio de sustentabilidade para as entidades tradicionalistas. A iniciativa da 1ª RT, na sua opinião, pode inspirar as demais do Rio Grande do Sul. “Se nos inspirarmos, por exemplo, na Revolução Farroupilha, temos muitas alternativas de rotas e vivências que podem ser oferecidas para o visitante”, afirma.
Por Sandra Veroneze
Foto: Mauro Heinrich