Aproveitando a discussão do desfile da Imperatriz, vamos fazer algumas reflexões sobre o Agronegócio e a Produção Cultural no Brasil.
Para começo de conversa muito se fala da importância do Agronegócio, principalmente sob o aspecto econômico, uma vez que o setor gera empregos e renda. Fato.
O Agronegócio é um setor importante e tem uma participação importante no PIB brasileiro (algo em torno de 30 a 35% do PIB Nacional). Todavia, a produção cultural, que recebe 35 vezes menos investimentos por parte do poder público, gera um PIB que é quase que a metade do PIB do agronegócio.(De 13 a 18% do PIB Nacional vem da chamada ECONOMIA CRIATIVA - produção cultural).
Ou seja: A Cultura, recebendo 35 vezes menos investimentos e subsídios, produz praticamente 50% de toda riqueza que o AGRONEGÓCIO produz.
O orçamento do governo para as pastas ligadas ao setor do agronegócio, os recursos disponibilizados para empréstimos, as isenções ficais e subsídios, contabiliza um volume 35 vezes maior do que o direcionado para o setor cultural, Enquanto a Cultura "consume" aproximadamente R$ 2,5 bilhões do orçamento, o setor agrícola consome do governo federal algo em torno de R$ 88 bilhões de reais todos os anos.
Além disso, no caso da Lei Rouanet, muitos setores da sociedade cobram dos produtores culturais que recebem o incentivo fiscal as chamadas "contrapartidas", mas com certo exagero, uma vez que na percepção de muitas destas pessoas, o produto cultural resultante deveria sempre ser oferecido gratuitamente uma vez que o produtor cultural recebe o chamado incentivo do governo.
Todavia, grande parte dos produtores do setor agrícola que recebem a isenção fiscal ou qualquer outra forma de incentivo do poder público, não tem a obrigação de cumprir uma contrapartida nem sequer próxima daquelas exigidas do setor cultural.
Quantos agricultores que recebem apoio do governo saem por aí distribuindo alimentos gratuitamente para a população? Pelo o que eu sei, nenhum. Posso estar enganado.
Outra questão interessante, é que enquanto o setor agrícola é considerado um setor estratégico e recebe por vezes uma maior atenção da sociedade, a produção cultural apresenta uma característica importante que chamamos de TRANSVERSALIDADE.
Transversalidade é a capacidade que a arte e a cultura tem de interagir com todos os demais segmentos da sociedade. Muitas vezes os projetos e ações culturais eles atuam e auxiliam no desenvolvimento de outros setores e segmentos, como o turismo, a educação, a saúde, a industria, o comercio e até mesmo a agricultura. Enquanto o agronegócio se fecha em si, a produção cultural é uma forma de agregar valor, interagir e auxiliar na construção da identidade cultural, principalmente contribuindo de forma significativa no processo de formação das pessoas e da sociedade.
Em outras palavras, sem querer desmerecer o agronegócio, mas também não reconhecendo ele como um segmento mais importante do que a produção cultural, podemos de forma figurada dizer que o agronegócio "dá" a comida para a sociedade, ou "dá" o peixe, enquanto a produção cultural ensina a sociedade a pescar.
E com isso, usando o velho ditado, é sempre muito melhor ensinar as pessoas a pescar do que dar eles simplesmente o peixe.
Por isso, nós produtores culturais, tentamos ensinar o povo a pescar.
Marcelo Miguel - produtor cultural