Sobre a
amizade nos processos criativos
Plinio Zalewski Vargas
Muitas são as características
apontadas para definir uma cidade como livre e criativa. Infra-estrutura
hardware bem resolvida – habitação, saneamento, saúde, educação, mobilidade – e
infra-estrutura software culturalmente diversificada - liberdade de pensar e
empreender - estão presentes em muitas análises e estudos. Barcelona, Nova York
e Nantes, neste sentido, são sempre lembradas.
Mas há um aspecto que nem sempre é
destacado, pelo menos com o entusiasmo que eu gostaria que energizasse o olhar
e as palavras. Falo da amizade como leitmotiv das relações humanas numa cidade.
Desde pequenos aprendemos que a amizade é
um anel com o qual adornamos os dedos de um outro, cuja companhia degustamos
num espaço privado, um território íntimo onde falamos de nós mesmos. Amigo,
repetem os mais antigos, é aquele que nos atende no sofrimento, no infortúnio,
que por nós sente compaixão.
De fato, na nossa alienação moderna, fica
difícil compreendermos a importância política da amizade na Pólis, embora seja
ela decisiva para seu bem-estar, como também para o exercício da liberdade, do
ir e vir não só das pessoas, mas especialmente dos seus pensamentos. E aqui
chegamos ao ponto: processos criativos só se expandem como o universo numa
Cidade, se proporcionamos colaborativamente uma ecologia de liberdade para
pensar, conversar, sonhar agir e celebrar conquistas. Neste sentido, a amizade
é principalmente nos rejubilarmos com a felicidade dos outros, em praça
pública, para que todos ouçam.
Philia, a amizade entre cidadãos, é
cultivada no espaço público, onde falamos sobre o mundo, ou seja, humanizamos o
que nos cerca. Falta de segurança, mobilidade urbana deficiente, falta de
cuidado com a Cidade, Parques abandonados, por um lado; lugares seguros, ciclovias,
corresponsabilidade, Parques ocupados e preservados, por outro: tudo isso só
evidenciará nossa presença no mundo, se forem assuntos objetos de discurso e
conversação entre nós e cujos produtos serão protótipos de soluções
diferentes,sonhos discordantes, idéias distintas e boa convivência. Do
contrário, os processos criativos são bloqueados pelas verdades de misantropos,
que se refugiam num mundo sem mundanidade, falando pra si mesmos, porque “não
consideram ninguém digno de conversar e se regozijar com eles”.
Porto Alegre vive um momento de altas
temperaturas para a criatividade. PortoAlegre.cc, Estúdio Nômade,Nós
Coworking,Aqui Bate um Coração,Shot the Shit, Porto Alegre Como Vamos, Cidade
Limpa, Espiral Positiva, Na Boa em Poa, Democracine,Observapoa,
Capacitapoa, todas elas e muitas outras
são iniciativas com alto potencial de philantropia, como os muito, mas
muito antigos entendiam “o amor dos homens”. O ambiente está preparado, as
amizades e conexões se multiplicam e são elas que reocupam a Cidade,
reintegrando o mundo ao mundano e calando as verdades, que são o contrário da
liberdade e, portanto, da curiosidade e criação.