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24 de maio de 2012

Blau Nunes traduzido


 
 
Acaba de ser lançada, pela editora L&PM, uma nova edição do clássico Contos gauchescos e lendas do sul, de Simões Lopes Neto (em 2012 comemoramos o centenário do lançamento do livro). Responsável pela introdução, fixação de texto e das diversas notas que enriquecem a leitura da obra, o escritor e professor de literatura brasileira da UFRGS Luís Augusto Fischer buscou esmiuçar a linguagem utilizada pelo autor através do personagem Blau Nunes (que faz uso de um vocabulário "gauchês"), produzindo textos explicativos e contribuindo assim para uma reapresentação dos Contos Gauchescos para o público leitor contemporâneo. Conversamos com o professor Fischer por e-mail sobre a nova edição do livro e o legado literário de Simões Lopes Neto:

CLL - O senhor disse que Simões Lopes Neto escolheu retratar um gaúcho diferente da imagem que os movimentos tradicionalistas normalmente "romantizam" no imaginário popular rio-grandense. A nova edição, com esse caráter de apresentação da linguagem e do gaúcho de Simões Lopes Neto pode ou incentiva uma visão mais abrangente e auto-crítica quanto à imagem do gaúcho?

Fischer - Primeiro uma ressalva, porque a pergunta pode induzir a erro histórico: não é que ele tenha escolhido uma abordagem para fugir ao tradicionalismo: este, como movimento, não existia ainda, quando ele escreveu. A obra mais madura de Simões Lopes Neto é da década de 1910, ao passo que o movimento tradicionalista nasceu depois da Segunda Guerra Mundial, depois de 1945. Feita a observação, vamos à outra parte: espero que a minha edição contribua para a leitura do texto, que é o que importa. Procurei facilitar a leitura do leitor de hoje, tanto fornecendo as notas de vocabulário quando apresentando uma perspectiva da biografia e dos procedimentos literários dele. Se isso vai incentivar uma visão menos conservadora da imagem do gaúcho: espero que sim, sinceramente.

CLL - Os trabalhos não publicados de Simões Lopes Neto escritos antes de Contos Gauchescos e mais direcionados para o público infantil contêm material relevante para o público leitor contemporâneo? Em que sentido?

Fischer - Certamente que contém material de interesse, sim, e isso vai ficar claro assim que pudermos publicar os manuscritos, nos quais estamos trabalhando. Como se trata de livros para público escolar de cem anos atrás, não vamos pensar que esses livros ainda inéditos devam agora ser adotados por escolas de ensino fundamental, porque é claro que nos últimos cem anos muita coisa mudou na pedagogia. Mas os livros por certo vão contribuir para entender melhor a obra madura dele, assim como vai nos dar uma notícia muito precisa sobre a época. Um dos livros, que tinha o nome original de "Terra gaúcha" (mas que não é o livro com esse nome, do mesmo autor, publicado postumamente -- é apenas o mesmo nome, não o mesmo livro, confusão que se deve ao reaproveitamento do título apenas isso), é narrado por um menino de seus 10 anos, o que dá idéia do interesse que tem o manuscrito.

CLL - O senhor acha que o legado literário de Simões Lopes Neto é bastante valorizado pelo leitor contemporâneo?

Fischer - Por mim, ele deveria ser mais conhecido. Mas é preciso entender que ele escolheu escrever num "gauchês" que atrapalha a leitura fluente do leitor comum. Isso fica pior quando se sabe que o tema da identidade local, gaúcha, é muito marcado por uma visão ufanista, não raro fanfarrona, que nada tem a ver com a obra madura de Simões Lopes Neto.