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29 de dezembro de 2012

ENTREVISTA COM FORTUNATI

DO SITE TERRA:


O prefeito eleito de Porto Alegre elogiou a presidente Dilma Rousseff, mas criticou o \"rancor\" do PT na cidade e afastou qualquer possibilidade de aliança para 2014 Foto: Luciano Lanes / Divulgação O prefeito eleito de Porto Alegre elogiou a presidente Dilma Rousseff, mas criticou o "rancor" do PT na cidade e afastou qualquer possibilidade de aliança para 2014
Foto: Luciano Lanes / Divulgação
Mauricio Tonetto
Direto de Porto Alegre

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Eleito no primeiro turno com 65% dos votos, o prefeito de Porto Alegre (RS), José Fortunati (PDT), promete retribuir a confiança recebida nas urnas com grandes obras de mobilidade urbana, melhorias na saúde e na educação pública, revitalização de pontos tradicionais da cidade e parcerias com o governo estadual para garantir a segurança da população nos próximos quatro anos. Em entrevista exclusiva ao Terra, o pedetista - que está no cargo desde março de 2010, quando deu continuidade ao mandato de José Fogaça (PMDB) - elogiou Dilma Rousseff (PT) e assegurou "lealdade" à presidente em uma eventual reeleição, mas criticou o "rancor" do partido na capital gaúcha e se disse cada vez mais distante de uma aliança.
 
Fortunati espera aproveitar a Copa do Mundo de 2014 para alavancar as obras e afirmou estar vivendo um sonho, salientando que vai cumprir seu mandato até o final e antecipando que "assina embaixo", de forma "natural", uma candidatura ao governo do Estado em 2018. Confira a seguir os principais trechos da entrevista, concedida na sede da prefeitura em 17 de dezembro.
 
Terra - O seu mandato será de continuidade ou de inovação?
José Fortunati - Eu tenho a clara percepção de que faço parte de um projeto político que começou em 2005, com a eleição de José Fogaça, foi renovado em 2008, quando ele foi reeleito e eu eleito vice-prefeito, e teve continuidade quando eu assumi a prefeitura em 30 de março de 2010. Naturalmente, com a minha eleição para 2013, o projeto tem de ter continuidade, mas não será um mero continuísmo. Eu tenho percepção plena de que a cidade quer mais e é por isso que usamos o slogan “fazer mais, fazer melhor” na campanha. Não dá para simplesmente continuar fazendo o que estamos fazendo, temos de ter mais empenho na próxima gestão. Não há ruptura nisso, e sim uma continuidade com mais qualidade. 
 
Terra - Como o senhor pretende fazer o transporte público funcionar melhor e como avalia o sucateamento e as denúncias de uso político da Carris (empresa pública de transporte)?
Fortunati - Tenho plena convicção de que a atual gestão da Carris não cometeu nenhuma irregularidade. Ela tem procurado conduzir a empresa de forma adequada, mas tem insuficiências administrativas. Por isso, já decidi a contratação de uma empresa de consultoria para que entre na Carris e faça um profundo levantamento gerencial e de gestão, para que a gente possa tomar as medidas adequadas. Não tem nada que macule a atual direção, o que nós temos que tomar são providências para que a Carris continue com um serviço de qualidade e operando numa zona de conforto também financeira.
 
A mobilidade urbana é um tema que ganha cada vez mais destaque na cidade, especialmente pelo grande volume de automóveis. Em Londres, o prefeito optou por reduzir de forma drástica o número de veículos na área central da cidade através do pedágio eletrônico. Essa não é uma ideia para Porto Alegre. Ainda temos um número de veículos adequado, mas para evitar um colapso do sistema, vamos, além de realizar 10 grandes obras viárias, apostar em transporte coletivo. Aí vem a implantação dos BRTs para reduzir a dramática jornada de 30 mil viagens diárias de ônibus para o centro da cidade. Como ele é muito atípico,  já que é cortado pelo muro do Cais Mauá, essas viagens causam um tumulto muito forte no trânsito e na mobilidade urbana de forma desnecessária. Com a colocação dos BRTs, nós vamos fazer com que haja uma conexão automática de todos os sistemas de transporte da região metropolitana e das regiões mais distantes da capital, dando com isso maior velocidade e qualidade.
 
Terra - E o metrô, é para quando?
Fortunati - Estamos agora na manifestação de interesse, onde as empresas deverão apresentar seus estudos até 15 de janeiro de 2013, e em seguida começamos a elaborar a licitação do metrô. Eu acredito que ela esteja concluída até a metade do ano e depois disso teremos o projeto executivo. Espero que no final de 2013 e início de 2014 o metrô de Porto Alegre já esteja em obras. Não existe qualquer desapropriação ao longo de todo o roteiro e isso é uma facilidade. Ele será um metrô logo abaixo da terra e não vai exigir grandes escavações. Se usarmos o tatuzão, o metrô poderá ter as obras prontas em até três anos e meio. A previsão de entrega é final de 2017 e início de 2018. Como nós ficamos discutindo a modelagem financeira do metrô com o governo federal durante um ano, houve atraso e é um prazo que não há como recuperar.
 
Estamos apostando também no transporte hidroviário e teremos uma linha que irá até o extremo sul da cidade. As bicicletas também têm cada vez mais se multiplicado em Porto Alegre e apostamos de um lado na construção de ciclovias e de outro na mudança de cultura dos motoristas de automóveis, com um respeito mais forte. Estamos percebendo mudanças. Eu acredito que a bicicleta vai passar a ser não somente uma fonte de lazer ou esporte, mas também de mobilidade.
 
Terra - Como está o projeto de revitalização do Cais Mauá (uma das obras da Copa do Mundo de 2014)?
Fortunati - Finalmente o Consórcio Cais Mauá fechou a modelagem financeira e conseguiu dois grandes investidores brasileiros. Estamos ultimando os projetos e temos um cálculo de que até março ou abril iniciam-se as obras de requalificação cais. Até a Copa de 2014 teremos a área dos armazéns concluída. Serão mais de 2 km de mix de atividades, como centro cultural, restaurantes e pontos de encontro. O projeto total deverá ficar pronto até 2016. Estou analisando os 27 projetos complementares da orla do rio Guaíba, até fevereiro de 2013 o licenciamento interno da prefeitura deve estar concluído e poderei fazer a licitação para revitalização da fase inicial, que é 1,5 km do entorno da Usina do Gasômetro, em direção à zona sul.
 
Terra - Essa região será privatizada?
Fortunati - Quem afirma isso desconhece o que acontece com relação ao Cais Mauá. Quem é que tem acesso hoje ao cais? Pouca gente. Com essa parceria público-privada, o cais vai se tornar público. Será um empreendimento privado, com acesso público. Cada armazém terá um empreendimento, mas ele será todo aberto à população, sem cobrança de ingresso. Historicamente, desde a construção do muro na década de 1960, o porto-alegrense não tem acesso ao Cais Mauá. Em vez de privatizarmos, estamos fazendo uma parceria para tornar o cais público.
 
Terra - Qual é a sua posição a respeito da denúncia contra Cássio Trogildo (PTB), de uso da secretaria de Obras Viárias para compra de votos? 
Fortunati - Quando tomamos conhecimento da denúncia do Ministério Público (MP), eu imediatamente solicitei contato com o MP para que a gente auxiliasse em tudo que eles entendessem adequado, e colaboramos. A partir do momento em que houve a denúncia formal, tomei a decisão de afastar o secretário municipal de Obras e Viação, Cássio Trogildo, que estava denunciado. Eu analiso isso com tranquilidade. O que estamos fazendo é buscar mecanismos para evitar que fatos idênticos aconteçam. A cada momento, eu trabalho para tornar mais transparentes as ações dos servidores e da máquina pública, porque quanto mais transparente elas forem, menor é a possibilidade de termos qualquer ato lesivo ao interesse público. Nós temos que terminar com a criação de dificuldades para que alguns possam buscar facilidades. 
 
Terra - Qual será o espaço do PP no seu governo? E o Wambert di Lorenzo (candidato do PSDB à prefeitura de Porto Alegre), será seu secretário?
Fortunati - Não, o Wambert foi convidado pelo vice-prefeito eleito, Sebastião Melo (PMDB), para compor o seu gabinete numa atividade de relações com a Câmara de Vereadores e a sociedade. Ele aceitou o convite e fará parte do gabinete de Melo. O PP certamente terá um espaço maior. Ele tem hoje duas secretarias e deverá contar no próximo mandato com quatro secretarias, que estamos definindo quais serão.
 
Terra - O senhor vai aumentar ou diminuir os cargos em comissão?
Fortunati - Estamos buscando uma qualificação dos serviços públicos. Fizemos um estudo sobre as secretarias e percebemos que existem várias com sombreamento entre si. Estamos retirando esses sombreamentos para que cada secretaria cumpra com o seu papel, cada uma deve ser potencializada ao máximo nas suas ações. Diminuímos cargos em comissão (CCs) na Procempa, nossa empresa de de tecnologia da informação (TI), na Carris e na EPTC (Empresa Pública de Transporte e Circulação). Estamos criando 341 cargos e extinguindo 343. Obviamente há custos, porque estamos qualificando a máquina para dar maior transparência e celeridade no serviço público. Nessa operação, teremos algo em torno de R$ 8,5 milhões de custos ao ano.
 
Terra - E a relação com o PT, como está depois da campanha eleitoral?
Fortunati - Eu vejo vários PTs. Um é o PT nacional, que está hoje comandando o País e com o qual eu tenho uma relação propositiva, construtiva. Não tenho dúvidas de que o governo da presidente Dilma Rousseff tem sido muito bom para nossas parcerias. Na última sexta-feira, por exemplo, a ministra Miriam Belchior (Planejamento) me telefonou dando conta de que foi aprovado um projeto de R$ 237 milhões para o departamento de Saneamento Básico, através do Orçamento Geral da União. Isso mostra a parceria que temos. Nós conquistamos R$ 800 milhões com o PAC da Copa. Em nível estadual, é uma relação institucional. Temos procurado manter um bom diálogo com o governo estadual (Tarso Genro, do PT), que começa a se aprofundar a partir duma relação que construímos depois das eleições, especialmente na área da segurança e saúde.
 
Já com o PT de Porto Alegre, a relação vai de mal a pior. Aqui nós temos um PT radicalizado, que não quer discutir a cidade. Eu sou atacado diariamente, 24 horas por dia. Para eles, qualquer iniciativa do governo municipal tem que ser atacada e isso vai ter consequências. A primeira é me levar a defender candidatura própria do PDT em 2014, porque eu não vou fazer qualquer inflexão em 2014 que aproxime os dois partidos se tenho na minha cidade um PT rancoroso. Eu sou prefeito da capital de todos os gaúchos, sou o prefeito que representa o PDT na maior cidade do Estado, não tem como pensar 2014 com o PT corrosivo como está. Isso está me levando ao afastamento total do PT do Rio Grande do Sul. Vou apoiar a presidente Dilma em 2014 e a minha lealdade a essa relação continua. Ela está fazendo um excelente governo, diferentemente do que acontece aqui no Estado.
 
Terra - E se o PT mudar de posição?
Fortunati - Precisamos estar abertos para construir. Eu não posso simplesmente olhar para 2014 e dizer que estaremos juntos, se estou todos os dias com o próprio PT solapando o meu governo. Ou nós somos parceiros de forma diferenciada e discutimos as coisas de forma aberta e construímos soluções, ou eu não posso ter uma posição que acaba sendo diferente no meu pensar 2014, sem olhar para a cidade.
 
Terra - O PDT defende o ensino integral na educação. É sua bandeira também?
Fortunati - Com certeza. Isso pode ser implantado de forma gradativa em Porto Alegre. Estamos hoje com cinco escolas de ensino fundamental em tempo integral e estamos iniciando a construção de mais cinco em lugares onde a demanda está necessitando. Todas as nossas 42 escolas infantis são em tempo integral. Caminhamos gradativamente e o meu objetivo é que até o final deste mandato nós tenhamos em Porto Alegre todas as escolas públicas municipais funcionando em tempo integral.
 
Terra - É uma ideia bem audaciosa. Ela passa por verba ou reestruturação?
Fortunati - É bem audaciosa, mas necessária. Passa pelas duas coisas. Falando em verba, já reuni minha equipe da educação para começarmos a discutir a gestão dos próximos quatro anos de uma forma muito precisa, para vermos onde a gente pode utilizar recursos, fazendo com que eles possam ser canalizados para o fortalecimento da escola em tempo integral.
 
Terra - O Tribunal de Contas da União divulgou um estudo mostrando que Porto Alegre tem um déficit de 189 mil vagas em creches. Como resolver isso?
Fortunati - Não é por passe de mágica. Nós temos hoje 40 creches ou em execução ou já planejadas, cada uma abrigando 120 crianças. Como diria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nunca antes nessa cidade tantas creches foram construídas. O que nós iremos fazer nos próximos quatros anos ficará sem precedentes. Eu tenho convicção de que não conseguirei atender a todas as crianças de 0 a 6 anos, mas vou tentar atender as crianças de 3 a 6 anos até o final do atual mandato.
 
Terra - E o problema das emergências hospitalares superlotadas, qual é a solução?
Fortunati - Estamos resolvendo. Aquilo que eu disse em março de 2010, de que a saúde pública seria a minha prioridade, está começando a aparecer na prática. A regulação de leitos é um exemplo. Quem é o gestor dos leitos hospitalares de qualquer hospital que atenda pelo Sistema Único de Saúde (SUS) é a prefeitura. Quando eu assumi em 2010, nós regulávamos apenas 2% deles, ou seja, eu sabia quem estava em apenas 2% dos leitos. Acabamos descobrindo que havia fraude na ocupação de leitos e há denúncias permanentes de indicação, os QIs. Agora estamos com 50% da regularização e vamos chegar ao final de 2013 com 100%. Isso fará com que os leitos sejam ocupados por quem realmente necessita e pelo SUS.
 
Também estamos ampliando o número de leitos. No último ano foram 500, e isso está dando suporte às emergências e diminuindo a pressão sobre elas. Inauguramos mais uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), a da zona norte, para desafogar o Hospital Conceição e o Hospital de Pronto Socorro (HPS), e finalmente conseguimos liberar um terreno utilizado como estacionamento para a construção de uma nova UPA, ao lado do Palácio da Polícia. Além disso, já estamos com o terreno comprado para a construção da terceira UPA no Largo Cairi. Tudo isso está criando as condições para que em pouco tempo a gente possa dar uma assistência mais adequada nas emergências. Estamos também informatizando todo o sistema de saúde. Hoje, 97% da nossa rede está informatizada e isso significa que, além do controle eletrônico do ponto, instalado no ano passado, nós temos o prontuário eletrônico e o chamado sistema de saúde à distância, com serviços que não necessitam levar o paciente até um hospital. Até 2014, a previsão é de que tenhamos mais de 1,1 mil leitos entregues. Saúde pública continua sendo prioridade absoluta.
 
Terra - Como o senhor vai entregar a cidade para o próximo prefeito? O que vai ficar da Copa do Mundo?
Fortunati - Eu espero entregar uma cidade melhor, para que as pessoas vivam em Porto Alegre, com as obras de mobilidade urbana, qualificação do transporte coletivo, revitalização do Cais Mauá e da orla do Guaíba, saúde pública de melhor qualidade e mais segurança, em parceria com o governo do Estado. A pretensão é de que a gente, com a realização da Copa do Mundo - não por causa do evento em si, mas usando o argumento da Copa - consigamos trazer para Porto Alegre investimentos que há muito tempo eram aguardados, mas não saíam do papel por falta de recursos. Isso só está acontecendo "graças" à Copa do Mundo e ficará como um grande legado. Espero que, ao sair do governo em 31 de dezembro de 2016, realmente possa olhar para a cidade e ver uma maior qualidade de vida.
 
Terra - E o senhor sai mesmo em dezembro de 2016?
Fortunati - Se Deus permitir, com toda certeza.
 
Terra - Um bom mandato na prefeitura o credencia para o governo do Estado?
Fortunati - De forma natural. Honestamente, não é essa a minha preocupação no momento. Agora eu quero fazer uma boa gestão em Porto Alegre. Depois disso, a gente analisa o próximo passo.
 
Terra - Dado esse cenário político de afastamento com o PT, é natural que surja o seu nome no PDT para 2018?
Fortunati - O PDT já lançou meu nome para 2018. Eu disse ao meu presidente, Romildo Bolzan Jr. (presidente estadual do PDT), que ele está muito antecipado no calendário, mas ele explicou que é exatamente para corroborar a minha tese de que eu não sou candidato em 2014. Quando as pessoas perguntam "e o Fortunati?", ele diz que é nosso grande candidato para 2018. Aí eu assino embaixo, porque isso retira toda e qualquer pressão sobre 2014. Eu tenho compromisso com o povo de Porto Alegre, um compromisso pessoal comigo mesmo de cumprir o meu mandato até 31 de dezembro de 2016. Hoje é meu sonho.