A Câmara Municipal de Porto Alegre promoveu, na noite desta
segunda-feira (14/10), no Plenário Otávio Rocha, uma audiência pública
sobre o projeto de revitalização para 5,9 quilômetros da orla do Guaíba,
apresentado pelo autor da proposta, o arquiteto paranaense Jaime
Lerner, e por um de seus sócios, o arquiteto Fernando Canalli. A
audiência, solicitada pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil no RS
(IAB-RS) e entidades de moradores e de ambientalistas, foi coordenada
pelo presidente do Legislativo da Capital, vereador Dr. Thiago Duarte
(PDT).
Lerner defendeu a revitalização da orla como fundamental para o
futuro de Porto Alegre, informando que o projeto foi fruto de um
trabalho intenso de dois anos. Segundo o ex-prefeito de Curitiba e
ex-governador do Paraná, a meta é oferecer à população um parque a
partir da Usina do Gasômetro para ser intensamente ocupado pelas pessoas
e que integre a cidade com o Guaíba. A proposta, de acordo com o
urbanista, está estruturada em grandes degraus para sempre preservar a
vista do lago. Frente às frequentes interrupções de pessoas da plateia,
que protestavam contra o projeto, garantiu que está aberto a
questionamentos e sugestões para melhorá-lo.
O projeto foi detalhado em imagens por Fernando Canalli. O
arquiteto lembrou que a proposta para os 5,9 quilômetros de orla
divide-se em duas fases: a etapa 1, definida como prioritária, vai da
Usina Gasômetro até a Rótula das Cuias, e a etapa 2 vai até o Arroio
Cavalhada, junto ao Barra Shopping Sul, no Bairro Cristal. Como atestou,
três premissas nortearam o trabalho. “Levamos em conta a vocação de
cada área, consideramos todos os elementos existentes e a implantação
foi de forma a provocar o menor movimento de terra possível a partir da
cota entre cheia e vazão do Guaíba”, informou.
Estacionamento e degraus
Canalli disse que, na implantação do Parque Usina do Gasômetro, o
estacionamento lateral do centro cultural será transferido para baixo da
estrutura do aeromóvel, ponto criticado por entidades ambientalistas e
de moradores. Para o local das antigas vagas, de acordo com ele, está
prevista área de grama e de piso seco. O trecho englobado pelo projeto
também contará com terminal turístico de barcos, bares, arquibancadas,
iluminação noturna, ciclovia, calçadão, banheiros, quadras esportivas,
instalação de bancos e quiosques.
Como complementou Lerner, devido à conformação em degraus do
parque, todos os equipamentos ficarão abaixo do visual de quem caminha
no calçadão. “Nenhum interromperá as visuais e todos estarão inseridos
nos degraus, que caracterizam o projeto”, afirmou. “As escadarias são
para que todos possam sentar, usufuir o parque e ter o visual,
incorporar o parque ao dia-a-dia. A ideia é de que, ao terminar o
por-do-sol, comece o chão de estrelas, o desenho no piso do calçadão”,
disse. “A iluminação é para que todo o parque possa ser utilizado
durante todas as horas, por quem quiser.”
Falta de concurso
O presidente do IAB-RS, Tiago Holzmann da Silva, criticou a falta
de concurso público para a elaboração do projeto para a orla e a escolha
pela “ferramenta antiquada do notório saber”, além da falta de
disposição para o diálogo demonstrada pela prefeitura. “Esta é a
primeira vez que a comunidade tem acesso público ao projeto”, disse.
Segundo Holzmann, o IAB solicitou audiência pública sobre a proposta
duas vezes ao Executivo, sem receber resposta. “Finalmente pedimos à
Câmara, que, de forma democrática, acolheu a ideia”, declarou.
A audiência pública, ao ver de Holzmann, é essencial para a
comunidade conhecer o projeto e para difundir a necessidade de
concurso para todas as obras públicas. Garantiu que não questiona a
qualidade do trabalho de Lerner, mas “a maneira mais correta e adequada
de contratar um projeto dessa envergadura é em concurso público”.
Lembrou que, no caso específico da orla, em 2007, o IAB-RS estabeleceu
uma longa negociação com a extinta Secretaria Municipal do Planejamento
para a realização de um concurso, já que existem muitos escritórios
qualificados. “Mas a ideia inicial foi abortada prematuramente”,
lamentou.
Holzmann ainda criticou o Executivo municipal por “blindar os
projetos mais importantes, impedindo a participação e a publicização”
dessas propostas. “As obras de vulto não vêm à discussão pública; a
comunidade não discute”, declarou. Holzmann lamentou o fato de Porto
Alegre não ter um espaço permanente para pensar a cidade, compartilhado
por todos os cidadãos. “Temos aqui uma grande oportunidade, a
possibilidade de que outras visões possam ter espaço no projeto ou nas
etapas subsequentes.”
Entidades e vereadores
Representantes de entidades e vereadores do PT e do PSOL criticaram
diversos pontos do projeto, como a transferência do estacionamento
lateral da Usina do Gasômetro para baixo do trilho do aeromóvel, por se
tratar de área da Praça Júlio Mesquita. Também questionaram a falta de
diálogo e o impacto ambiental das intervenções e endossaram a exigência
do IAB-RS para que os projetos de todas as obras públicas sejam
escolhidos em concurso público.
Em suas considerações finais, Lerner disse que ouviu com “muito
respeito” as críticas e sugestões e que tentará aproveitá-las e
entendê-las. “Agora, algumas coisas, numa apresentação sumária de um
projeto de mais de 600 pranchas e 24 projetos complementares, é claro
que são muito difíceis”, afirmou. Questionou algumas críticas. “Falou-se
em mobilidade como se não tivéssemos considerando isso. Tudo
isso levantado aqui está detalhado, mas não podemos ser responsáveis
pela relação entre IAB e prefeitura”, declarou. Segundo ele, o objetivo
do projeto foi “abrir um caminho” para que os arquitetos e profissionais
possam contribuir.
Encaminhamentos
Dr. Thiago encerrou a audiência anunciando que a Câmara acolheu os
encaminhamentos sugeridos pelo IAB-RS, pelas entidades e pelos
vereadores presentes. Informou que solicitará a Lerner o projeto na
íntegra para ser exposto à comunidade. Também disse que o vice-prefeito
Sebastião Melo, presente à audiência, não poderia se manifestar por
força regimental, mas que falaria na Câmara sobre o projeto para a orla
em outra oportunidade.
Além de Lerner, Canalli, Holzmann, Dr. Thiago e Melo, compôs a mesa
da audiência o engenheiro Régis Batista, representante do Conselho
Regional de Engenharia e Agronomia (Crea). Fizeram questionamentos e
considerações os vereadores Fernanda Melchionna (PSOL), Sofia Cavedon
(PT), Engenheiro Comassetto (PT), Marcelo Sgarbossa (PT), Professor
Garcia (PMDB) e Airto Ferronato (PSB). Os vereadores Alceu Brasinha
(PTB), Lourdes Sprenger (PMDB), João Carlos Nedel (PP) e Mônica Leal
(PP) também participaram.
Texto: Claudete Barcellos (reg. prof. 6481)