Novos projetos e boa frequência do público nos ciclos de filmes dão novo gás à cinefilia em Porto Alegre
Sessões, debates, publicações e até festivais resgatam tradição cineclubista da cidade
Daniel
Feix
Em
2008, Porto Alegre recebeu uma mostra com filmes inéditos na cidade de
realizadores festejados como Jia Zhang-ke, Hou Hsiao-hsien e Apichatpong
Weerasethakul. Era a mostra do ano na Capital, mas nem isso mobilizou o público
à Sala P.F. Gastal – foram, em média, entre 10 e 20 espectadores por
sessão.
Em
2013, as coisas estão diferentes. Uma série de ciclos de filmes com apelo
semelhante (o de Béla Tarr, o de Jacques Rivette, entre outros), além do
surgimento de projetos de cinema (sessões especiais, publicações e até
festivais) dão a impressão de que os cinéfilos acordaram. Há mais eventos
ligados à cinefilia e, além disso, mais público nesses eventos – no caso das
citadas mostras de Tarr e Rivette, os 118 lugares da P.F. Gastal não foram
suficientes para acomodar todos os interessados em diversas sessões.
–
Trabalho na sala desde 1999 e nunca havia visto uma renovação dos espectadores
como a que ocorre desde o ano passado – afirma Marcus Mello, coordenador de
cinema da Secretaria da Cultura da cidade, responsável pela programação da P.F.
Gastal.
–
O público está mais diversificado, não há apenas aqueles cinéfilos de sempre –
observa João Pedro Fleck, do Cine Santander, que nesta terça-feira inaugura
justamente uma mostra sobre cinefilia.
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Leia mais: ciclo compila filmes que declaram amor ao cinema>
E ainda: as descobertas de Enéas de Souza, de "Os Filmes Estão
Vivos"
A
renovação implode a teoria apocalíptica de que, com o boom do compartilhamento
de filmes pela internet, salas dedicadas a programações alternativas
sucumbiriam. Era essa a explicação recorrente para a pouca frequência dessas
salas, anos atrás.
–
É que ver o filme no cinema faz diferença – diz Fleck. – Talvez a gurizada tenha
se dado conta disso depois de ver muito filme no laptop, pausando a reprodução
para responder mensagens no Facebook.
Contam,
para o boom da nova cinefilia, a boa programação desses espaços (vale citar
também o CineBancários, o Guion Center, a Sala Redenção, o Instituto NT e a
Cinemateca Paulo Amorim) e a qualidade da projeção digital que eles oferecem,
especialmente com o Super Blu-ray, que em muito supera os equipamentos usados
anteriormente.
Fundamentalmente,
no entanto, a renovação tem a ver com o interesse de uma turma de 20 e poucos
anos, em parte oriunda dos cursos superiores de cinema. Além de frequentarem as
salas, são eles que estão por trás de muitas iniciativas cinéfilas
recentes.
Seu
interesse, pelo perfil dessas iniciativas, não é só ver os filmes, mas
debatê-los. Tome-se como exemplo a Sessão Plataforma: o patrocínio da cervejaria
Rasen garante um incentivo para as rodas de conversa pós-sessão. E, também, o
grupo por trás da Sessão Aurora e do Zinematógrafo (são cerca de 10, entre os
quais Leonardo Bomfim e Cristian Verardi, que trabalham na P.F. Gastal): eles se
reúnem periodicamente para falar sobre temas pré-definidos dentro do universo do
cinema e programam as sessões conforme o andamento da conversa.
–
A ideia é mesmo retomar o espírito dos cineclubes – explica Bomfim.
–
O que essa gurizada está fazendo é o que a minha geração fazia nos anos 1990 –
comenta Gustavo Spolidoro, cineasta e professor do curso de cinema da
PUCRS.
É
como se, após a efervescência promovida pela "galera do Super-8", chegasse a
hora da geração formada pelos cursos superiores de cinema. Demorou, mas os novos
cinéfilos estão aí.
Alguns
projetos cinéfilos de Porto Alegre
Clube
de Cinema de Porto AlegreFundado em 1948, tem sessões aos sábados e
domingos pela manhã, nas salas do circuito. É o exemplo mais remoto da vocação
cinéfila da cidade: em 65 anos, suas atividades nunca foram interrompidas. "Nem
durante a ditadura militar, quando tínhamos de apresentar o filme aos censores
antes", lembra o crítico Hiron Goidanich, o Goida.
Diálogos
de cinemaVoltado aos curtas, o Festival Diálogo de Cinema terá sua
primeira edição em novembro. É mais um dos jovens festivais porto-alegrenses –
outros são o Close, voltado à diversidade sexual, e o Democracine, com filmes de
caráter mais político.
Cinedrome
e Cine F
A tradição cineclubista chegou aos (já nem tão) novos cursos superiores de cinema do Rio Grande do Sul. O Cinedrome começou na Unisinos e se espraiou por outros espaços da Capital. O Cine F é uma iniciativa de alunos da UFRGS e é realizado na Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação Social da universidade (Fabico).
A tradição cineclubista chegou aos (já nem tão) novos cursos superiores de cinema do Rio Grande do Sul. O Cinedrome começou na Unisinos e se espraiou por outros espaços da Capital. O Cine F é uma iniciativa de alunos da UFRGS e é realizado na Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação Social da universidade (Fabico).
Aurora,
ZinematógrafoO mesmo grupo que fundou o fanzine à moda antiga
Zinematógrafo promove a Sessão Aurora, na Sala P.F. Gastal. "A Aurora é a irmã
vaidosa do Zinematógrafo", brinca Leonardo Bomfim. Além da exibição de filmes, o
projeto Aurora inclui ainda uma revista digital, sem periodicidade
definida.
Cine
Divã e Cineterapia
O primeiro é realizado pela Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre no Instituto NT.
O segundo, pelos terapeutas Cinthya Verri e Roberto Azambuja no CineBancários.
O primeiro é realizado pela Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre no Instituto NT.
O segundo, pelos terapeutas Cinthya Verri e Roberto Azambuja no CineBancários.
Sessão
PlataformaProjeto mensal que traz à cidade longas badalados no circuito
de festivais que, não fosse por sessões especiais como esta, dificilmente
ganhariam exibições em Porto Alegre.
Mostra
de Vídeo IndependenteCoordenada por Nicanor Santos, é realizada desde
2000 na Sala A2B2 da Casa de Cultura Mario Quintana. Já são 140 edições.
Raros"Filmes
que você sempre quis ver ou nem imaginava que existiam." É o slogan do Projeto
Raros, criado em 2003 para apresentar ao público local títulos nunca lançados no
circuito exibidor brasileiro ou há muito tempo fora de circulação nos cinemas,
procurando reproduzir o espírito das "midnight movies" realizadas em Nova York a
partir do final dos anos 1960. Tem lugar na Sala P.F. Gastal nas noites de
sexta-feira e participações, entre outros, do crítico Carlos Thomas
Albornoz.